quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Como a classe média alta brasileira é escrava do “alto padrão” dos supérfluos

Opa, e ae rapeize!

Alguns amigos compartilharam esse texto no facebook hoje, e meio que por destino coincidiu com um texto que eu estava pra escrever. 

A minha idéia é dizer que nós, e quando eu digo nós eu me refiro a quem faz intercâmbio. Como eu ia dizendo, a minha idéia é dizer que não preisamos ser ricos pra ter uma vida boa morando aqui, porque não temos a influência consumista como temos no Brasil. Aqui as pessoas são quem são e não são o que tem pra mostrar.  Enfim, da uma olhada no texto e entenda o que eu quero dizer.

Mas o texto foi tão surpreendente que eu vou apenas reproduzir e dizer que concordo com tudo o que foi dito pela autora. 

Cheers




No ano passado, meus pais (profissionais ultra-bem-sucedidos que decidiram reduzir o ritmo em tempo de aproveitar a vida com alegria e saúde) tomaram uma decisão surpreendente para um casal – muito enxuto, diga-se – de mais de 60 anos: alugaram o apartamento em um bairro nobre de São Paulo a um parente, enfiaram algumas peças de roupa na mala e embarcaram para Barcelona, onde meu irmão e eu moramos, para uma espécie de ano sabático.

Aqui na capital catalã, os dois alugaram um apartamento agradabilíssimo no bairro modernista do Eixample (mas com um terço do tamanho e um vigésimo do conforto do de São Paulo), com direito a limpeza de apenas algumas horas, uma vez por semana. Como nunca cozinharam para si mesmos, saíam todos os dias para almoçar e/ou jantar. Com tempo de sobra, devoraram o calendário cultural da cidade: shows, peças de teatro, cinema e ópera quase diariamente. Também viajaram um pouco pela Espanha e a Europa. E tudo isso, muitas vezes, na companhia de filhos, genro, nora e amigos, a quem proporcionaram incontáveis jantares regados a vinhos.

Com o passar de alguns meses, meus pais fizeram uma constatação que beirava o inacreditável: estavam gastando muito menos mensalmente para viver aqui do que gastavam no Brasil. Sendo que em São Paulo saíam para comer fora ou para algum programa cultural só de vez em quando (por causa do trânsito, dos problemas de segurança, etc), moravam em apartamento próprio e quase nunca viajavam.

Milagre? Não. O que acontece é que, ao contrário do que fazem a maioria dos pais, eles resolveram experimentar o modelo de vida dos filhos em benefício próprio. “Quero uma vida mais simples como a sua”, me disse um dia a minha mãe. Isso, nesse caso, significou deixar de lado o altíssimo padrão de vida de classe média alta paulistana para adotar, como “estagiários”, o padrão de vida – mais austero e justo – da classe média europeia, da qual eu e meu irmão fazemos parte hoje em dia (eu há dez anos e ele, quatro). O dinheiro que “sobrou” aplicaram em coisas prazerosas e gratificantes.

Do outro lado do Atlântico, a coisa é bem diferente. A classe média europeia não está acostumada com a moleza. Toda pessoa normal que se preze esfria a barriga no tanque e a esquenta no fogão, caminha até a padaria para comprar o seu próprio pão e enche o tanque de gasolina com as próprias mãos. É o preço que se paga por conviver com algo totalmente desconhecido no nosso país: a ausência do absurdo abismo social e, portanto, da mão de obra barata e disponível para qualquer necessidade do dia a dia.


Traduzindo essa teoria na experiência vivida por meus pais, eles reaprenderam (uma vez que nenhum deles vem de família rica, muito pelo contrário) a dar uma limpada na casa nos intervalos do dia da faxina, a usar o transporte público e as próprias pernas, a lavar a própria roupa, a não ter carro (e manobrista, e garagem, e seguro), enfim, a levar uma vida mais “sustentável”. Não doeu nada.

Uma vez de volta ao Brasil, eles simplificaram a estrutura que os cercava, cortaram uma lista enorme de itens supérfluos, reduziram assim os custos fixos e, mais leves,  tornaram-se mais portáteis (este ano, por exemplo, passaram mais três meses por aqui, num apê ainda mais simples).

Por que estou contando isso a vocês? Porque o resultado desse experimento quase científico feito pelos pais é a prova concreta de uma teoria que defendo em muitas conversas com amigos brasileiros: o nababesco padrão de vida almejado por parte da classe média alta brasileira (que um europeu relutaria em adotar até por uma questão de princípios) acaba gerando stress, amarras e muita complicação como efeitos colaterais. E isso sem falar na questão moral e social da coisa.

Babás, empregadas, carro extra em São Paulo para o dia do rodízio (essa é de lascar!), casa na praia, móveis caríssimos e roupas de marca podem ser o sonho de qualquer um, claro (não é o meu, mas quem sou eu para discutir?). Só que, mesmo em quem se delicia com essas coisas, a obrigação auto-imposta de manter tudo isso – e administrar essa estrutura que acaba se tornando cada vez maior e complexa – acaba fazendo com que o conforto se transforme em escravidão sem que a “vítima” se dê conta disso. E tem muita gente que aceita qualquer contingência num emprego malfadado, apenas para não perder as mordomias da vida.

Alguns amigos paulistanos não se conformam com a quantidade de viagens que faço por ano (no último ano foram quatro meses – graças também, é claro, à minha vida de freelancer). “Você está milionária?”, me perguntam eles, que têm sofás (em L, óbvio) comprados na Alameda Gabriel Monteiro da Silva, TV LED último modelo e o carro do ano (enquanto mal têm tempo de usufruir tudo isso, de tanto que ralam para manter o padrão).

É muito mais simples do que parece. Limpo o meu próprio banheiro, não estou nem aí para roupas de marca e tenho algumas manchas no meu sofá baratex. Antes isso do que a escravidão de um padrão de vida que não traz felicidade. Ou, pelo menos, não a minha. Essa foi a maior lição que aprendi com os europeus — que viajam mais do que ninguém, são mestres na arte do savoir vivre e sabem muito bem como pilotar um fogão e uma vassoura.

PS: Não estou pregando a morte das empregadas domésticas – que precisam do emprego no Brasil –, a queima dos sofás em L e nem achando que o “modelo frugal europeu” funciona para todo mundo como receita de felicidade. Antes que alguém me acuse de tomar o comportamento de uma parcela da classe média alta paulistana como uma generalização sobre a sociedade brasileira, digo logo que, sim, esse texto se aplica ao pé da letra para um público bem específico. Também entendo perfeitamente que a vida não é tão “boa” para todos no Brasil, e que o “problema” que levanto aqui pode até soar ridículo para alguns – por ser menor. Minha intenção, com esse texto, é apenas tentar mostrar que a vida sempre pode ser menos complicada e mais racional do que imaginam as elites mal-acostumadas no Brasil.

10 comentários:

  1. Muito bom o Texto. Parabéns para a autora, pelos ótimos argumentos usados para mostrar a realidade de um "padrão de vida de ostentação" brasileiro que a maioria sabe e não quer enxergar que é absurdo. Parabéns a você, por divulgar. Espero, ansiosamente, pelo dia de embarcar rumo a Irlanda.

    Continue com suas ótimas postagens Mario.

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  2. Fala Marião

    Esse texto foi a gota d'água! Eu já o tinha lido Muito bom!

    Até logo

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  3. Muito bom o texto, valeu por compartilhar. Nos faz refletir e nos deixar ainda mais confiantes em por em prática o sonho e ser intercambista e viajante!

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  4. Eu questiono isso todos os dias que chego no trampo com a minha gravatinha.
    Tanto espetáculo acontecendo por aí e a gente querendo ter estabilidade...

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  5. Ótima matéria! É bom para refletir se realmente vale a pena esse sacrifício para tentar manter um padrão de vida e se manter escravo dele.

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  6. Excellent! Vivendo aqui aprendi a rever os conceitos de padrão e qualidade de vida, a cada dia me sinto mais feliz por, como dizia Renato Russo, não tenho que provar nada à ninguém, sou o que sou e feliz assim sou!

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  7. É pensando nesse contexto que decidi passar um ano na Europa a partir de outubro. Não sei o que me espera, mas estou convicto de que no mínimo preço justo pagarei.
    Parabéns pelo texto!

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  8. Meus pais, já considerados melhor idade com corpinho de 40 e loooonge anos luz do padrão classe média alta Paulistana (o que é rico pra caramba!!!) já entenderam, se apaixonaram e adotaram a busca e o anseio pelo maior prazer que um ser humano pode ter, viajar!
    Economizar no Brasil é uma tarefa árdua, viver em um lugar onde 100 Reais não paga 1/5 de um carrinho de supermercados é caro demais... Mas eles economizam no sofá em L e no mínimo 16 dias por ano, viajam pela Europa, já conhecem 7 países, várias cidades e renovam suas almas com tanta beleza e qualidade de vida.
    Posso dizer que quando se aposentarem a Europa corre o risco de ganhar mais dois imigrantes.
    Eu vou antes deles, mas os aguardo ansiosamente.

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  9. Aqui infelizmente nós nos matamos por pouco, a inflação é altíssima, somos diariamente desrespeitados por nossos governantes e achamos que estamos no topo de mundo. Já cansei de ouvir europeu falando que as coisas no Brasil são muito caras, isso que eles ganham 3 vezes mais hein. Se for comparar o mínimo então, meu deus, realmente conseguimos fazer milagres nesse país. Já tinha lido esse texto e foi a gota d'água para mim. To indo para aí Marião !!! Segura a caneca aí parceiro !!!

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  10. Gente adorei esse texto, uma boa galera deveria ler e aprender um pouco mais. Viajei e fiz um intercâmbio, senti a mesma coisa que vc Mario. Os brasileiros, uma boa parte, estão se preocupando com bolsas caras, sofás, carros e serviços caros, que nem sempre são bons. Enquanto isso, o pessoal lá fora: estão viajando, conhecendo culturas, pessoas e botando a mão na massa. Adorei a publicação. Parabéns.

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