Histórias de Intercâmbio - Lucas Lima

Hoje faz um ano que embarquei na experiência, até o momento, mais grandiosa da minha vida. Com isso, o melhor que posso fazer é compartilhar algumas das minhas histórias com vocês e para isso farei um balanço verdadeiro do que aconteceu, assim posso mostrar que tudo não são flores. Isto é para algumas pessoas que insistem em me estereotipar como “mauricinho bad boy”.

O mundo novo - este foi o meu primeiro pensamento antes e depois de colocar os pés na terra dos duendes. Durante o processo de pré-viagem passei por alguns momentos que considero normal - sentimental, financeiro, profissional -, mas que fizeram a diferença na minha decisão.

De princípio, só pensava em aprender um novo idioma, mas esquecia de todo um contexto de sobrevivência no qual eu apelidei de "Selva", é exatamente esta palavra: "Selva", pois todos lutam por sobreviver por lá. Não foram poucas as pessoas que conheci que voltaram antes do previsto, desde uma depressão por estar fora de casa, até um irmão e familiares atingidos no incêndio da Boate Kiss.

Muitos, como eu, chegam com o dinheiro contado para se manter por 6 meses, mas esquecem das contingências e foi exatamente o que aconteceu comigo. No meu terceiro mês de Irlanda tive a infelicidade de saber que minha fonte de renda no Brasil havia se encerrado e eu não tinha quaisquer reservas, tampouco para pagar meu aluguel do mês. Afinal, nenhuma pessoa com mais experiência, de Irlanda, me alertou para este problema. O resultado foi um descontrole nos gastos nos primeiros meses e a consequente crise. É, fui burro!

Todavia, são nestes momentos que aprendemos a sobreviver ou ficar pior ainda. Como o velho ditado “quando a água bate na bunda, aprendemos a nadar” rsrs. Tudo começou quando passei minha primeira semana sem minha mala, já que houve desvio e só a recebi dias depois. Era só o começo do que estava por vir... Com um inglês nível “beginner”, fiz meu CV descrevendo que estava susceptível a um trabalho não remunerado para ter minha primeira experiência, assim teria uma indicação na Irlanda, o que já ajuda muito, imprimi mais de 300 cópias. Além disso, tive a ajuda do pessoal da Escola SEDA - Mario, Netânia, Viktor, Tiago, Tarini - , que criaram um programa com objetivo semelhante: ajudar aos alunos a melhorar o inglês e conquistar a primeira experiência. Deste meu plano nasceu uma esperança, pois fui chamado para uma entrevista de trainee como Kitchen Porter - Assistente de Cozinha. Era a minha oportunidade, pois trabalhar na cozinha eu já garantiria duas refeições ao dia.

Mais um exemplo da "Selva", algumas vezes pedia emprestado alguns euros aos meus flatmates, para comprar comida, mas não era sempre que obtinha um “sim” como resposta. Em nenhum momento passei estes problemas para minha família, aliás, vocês são os primeiros, a tomarem ciência de tudo. Entrei em contato com um amigo no Brasil e este me emprestou o suficiente para me manter por mais um mês, tempo de duração do meu trainee, UNPAID. Aliás, gostaria de agradecer, de coração, a todas as pessoas que me ajudaram não me arrisco a escrever nomes para não cometer injustiça. 

Comecei a trabalhar na cozinha com um único objetivo: mostrar meu melhor e ser contratado. Como disse meu inglês ainda era muito básico e logo na minha segunda semana a Chefe de cozinha, enquanto eu lavava algumas panelas, disse: " Lucas, your English is very bad, it’s better for you get a trainne in accommodation at this Hotel". Nunca me esquecerei disso. Ouvi como um banho de água fria, ela tinha o meu melhor. Não foram poucas as vezes que trabalhei por mais de oito horas ao dia sem receber NADA. Baixei a cabeça, respirei fundo e decidi em frações de segundos em não desistir. Voltar para o Brasil "fracassado" nunca foi meu plano. Após este dia passei a me dedicar mais ao estudo da língua e a realizar um trabalho fora do normal, eu corria na cozinha, tentava fazer tudo bem feito no menor tempo possível. Fiquei nesta situação por 5 semanas e o resultado disso tudo: CONSEGUI O EMPREGO! Lembram-se da chefa que me "desmotivou"? Ela fez questão de me indicar para outro restaurante com carta de referência e certificado, pois no Hotel onde fui trainee não havia vaga para contratação. Neste novo emprego tive a felicidade e condições financeiras de me manter, mesmo longe dos meus pais, e aproveitar a vida na Europa. A conquista deste emprego ocorreu dois meses antes, da minha primeira data de retorno: 15 de maio, data prevista de conclusão dos meus 6 primeiros meses. 

Neste momento pensei, passei por tantos momentos difíceis que quando as coisas começam a melhorar eu tenho que voltar. Com este questionamento foi fácil decidi remarcar a passagem e ficar mais 6 meses. 

As coisas não foram fáceis, conciliar os estudos pela manhã com o trabalho muito pesado: trabalhar por 12 horas diárias, sozinho em 4 andares, lavar milhares de pratos e panelas, chão, trocar lixo, etc. Enfim, em 5 meses fui chamado para ser Chefe de cozinha, ajudei 4 conhecidos a conseguir emprego e hoje acho que adquiri um belo ciclo de experiências.

Por fim, conheci mais de 20 países, quase todo o território Irlandês e fiz amizade com pessoas maravilhosas de toda parte do mundo além, claro, de me apaixonar por um Estado brasileiro chamado Minas Gerais. 

Dos lugares que visitei deixo uma observação para a Croácia, lugar de beleza impar no qual não me arrisco a descrever, só conhecendo para entender, e para o Marrocos, onde a gritante diferença de cultura se torna algo indescritível. 

O mais importante de tudo foi o mérito de viver de forma simples e ser feliz. De sair de casa caminhando ou de bicicleta e não precisar de um carro. Não me lembro de ter ficado preso no engarrafamento. Vocês não imaginam o bem que foi poder conversar com as pessoas sem pressa, sabendo harmonizar em minha voz as palavras necessárias. 

Não esqueçam que dinheiro ajuda a ter uma boa vida, mas a ganância por riqueza faz com que perca algo muito mais importante que isto, o TEMPO. Este nunca voltará e no futuro irá se arrepender por não ter aproveitado. Portanto, aproveitem o máximo, com responsabilidade e não se apeguem a bens materiais, pois ninguém leva nada com a morte. Já as experiências...

O fato é que sabemos muito sobre escolhas conscientes. Mas sabemos pouco sobre desejos e sensações, e vivemos mergulhados em ritmo frenético onde a cultura é quem pode e tem mais.

*Meu nível de inglês melhorou muito. Fluência é algo que se adquire com prática e isso requer tempo. Neste um ano, superei as minhas expectativas!!!

Não desistam dos seus objetivos e sonhos, pois o FUTURO quem faz somos NÓS.

Salvador, 31/10/2013. 

Lucas Lima